Pais e filhos juntos na vida e também nos negócios

Na infância, filhos enxergam os filho como heróis.

Passam a admirar gostos musicais, aprendem atitudes e valores. Quando eles crescem, em muitos casos, essa admiração alcança também suas preferências profissionais. Quando há negócios em família, eles passam a ser os sucessores com um desafio: manter vivo o legado do pai .

Nesta hora, a sucessão não é algo tão simples de se fazer. Dados do Instituo Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e do Sebrae apontam que as empresas familiares representam a maioria das companhias brasileiras e equivalem a 90% do total. Contudo, apenas 30% chegam à segunda geração e só 10% à terceira.

“As companhias mais tradicionais que aqui se desenvolveram junto com a capital estão em fase de passagem de bastão”, comenta o especialista em gestão de empresas, Marcelo Camorim. Ele explica que o grande desafio da segunda geração é manter o carisma e a energia do fundador, que ancoraram o sucesso da organização.  “A sucessão não começa da noite para o dia. São anos de história e treinamento para o herdeiro se preparar para sentar na cadeira do patriarca”, diz.

Uma dessas companhias é a OM Incorporadora, com 37 anos de história. Os filhos dos três sócios-fundadores – Gabriel Oliveira, de 68 aos, Valdivino Oliveira, de 69 anos, e Luiz Cesar Melo, também 69 – estão assumindo o comando da empresa. Em seus lugares, estão a publicitária e administradora Ana Flávia Canedo, de 35 anos, o engenheiro João Gabriel Tomé e o arquiteto Victor Tomé, irmãos gêmeos de 35 anos, além do gestor de agronegócio Paulo Siqueira, de 38 anos.

“Eles estão tendo um ótimo desempenho, estão fazendo a empresa crescer, se profissionalizar ainda mais, estão adaptados ao novo mercado e às novas tecnologias. Eles deixaram a marca mais forte”, diz um dos fundadores, Valdivino.

O processo de sucessão iniciou há cinco anos. Mas essa história começou bem atrás, ainda na infância. Ela cresceu junto com a admiração dos filhos pelo trabalho de seus progenitores.  João Gabriel Tomé conta que seu pai nem estimulava que ele e seus irmãos seguissem o seu caminho na engenharia. “Ele dizia que era um mercado difícil e uma profissão complicada”, lembra. A identificação falou mais alto e ele se formou engenheiro, o irmão Victor Tomé fez arquitetura e o caçula, André Oliveira, fez engenharia.

Escolhido o caminho, engana-se quem pensa que ele foi fácil.  “Eu e os irmãos fizemos estágio na empresa do meu pai e não tínhamos nenhuma regalia ou privilégio. Trabalhávamos como qualquer outro contratado e tínhamos a cobrança direta dos donos, já que éramos filhos. Isso nos levou a nos dedicar mais e mais”, revela.

João Gabriel disse que foi, no período do estágio, que ele teve certeza de que desejava fazer exatamente o que o pai fazia. Depois que se formou, foi trabalhar São Paulo, pois queria conhecer um mercado mais maduro e profissionalizado. Também fez uma pós-graduação na USP e tudo isso já fazia parte da preparação sucessória.

“Sabíamos que isso iria ocorrer, mas o processo foi acelerado porque meu pai acabou ficando doente”, explica o empresário. João Gabriel revela ainda que o processo de sucessão na Oliveira Melo foi profissionalizado graças a sugestão do também herdeiro Paulo Siqueira, filho do sócio-fundador Luiz Cesar Melo. “Ele já havia passado por esse processo na empresa de agronegócio da mãe dele em Goianésia e nos sugeriu que fizéssemos o mesmo aqui”, lembra João.

Na visão da publicitária e administradora Ana Flávia Canedo, filha do outro sócio-fundador da OM Incorporadora, seu pai nem imaginava que ela assumiria seu lugar.  “Por ser uma empresa de engenharia, pelo fato de ser mulher e minha formação não ser na área”, enumera as razões. Mais uma vez, a admiração falou mais alto e, em nome do orgulho do legado construído por ele, a moça encarou o desafio de se tornar uma executiva em um setor tradicionalmente gerido por homens.

“No começo, senti que havia uma certa desconfiança de muitos em relação se conseguiria ou não. Não me incomodei com isso e fui trabalhar em empresas parceiras e até em concorrentes para entender o que era o mercado e como ele funcionava. Provei que tinha muito para contribuir e não estava ali somente por ser herdeira”, revela ela.

Hoje, os fundadores estão no Conselho de Administração da empresa, acompanhando o desenvolvimento da companhia. Com 37 anos de história e mais de 1 milhão de metros quadrados construídos nesse período, a empresa está assumindo o protagonismo do setor imobiliário.

Lançaram, no início do ano, um edifício de altíssimo padrão que terá a maior cobertura da cidade, com mais de mil metros quadrados. Estão investindo em projetos que contribuem para a revitalização de bairros tradicionais, como o Oeste. Nos últimos seis meses, contabilizou a comercialização de R$ 96 milhões em projetos imobiliários realizados em parceria da City Soluções Urbanas – outro negócio da engenharia fundado por João Gabriel Tomé.

“Nossa empresa que nasceu do sonho de três jovens engenheiros recém-saídos da faculdade. Nós nos sentimos honrados em ver os filhos usarem sua energia e criatividade para dar sequência a nossa história, tornando-a suas também.  É o desejo de todo pai”.

O consultor em gestão e especialista em governança corporativa, Marcelo Camorim, salienta que o planejamento da sucessão foi o passo fundamental para que o processo sucessório da OM Incorporadora fosse bem sucedido. Mas, infelizmente, essa conduta não é tomada pela maioria das empresas.

Segundo o estudo “Governança em Empresas Familiares: Evidências Brasileiras”, divulgado este ano e realizado pelo Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), em parceria com a PWC, menos de 40% dos negócios de família no País possuem algum plano de sucessão. A ausência desse planejamento sucessório, conforme explica Camorim, acaba contribuindo, em grande parte, para que a maioria das empresas familiares não cheguem à segunda geração.

“Apesar de saberem que ninguém é eterno no comando e da necessidade de se passar o bastão, muitos fundadores de empresas não se preparam ou percebem a importância de se estabelecer um processo sucessório. Esse processo de troca de comando entre as gerações ocorre quase sempre de forma abrupta e pega todos de surpresa, quando os herdeiros não estão preparados para assumir as novas posições”, esclarece Marcelo Camorim.

Conforme o especialista em governança corporativa, em havendo a predisposição do herdeiro ou herdeiros em assumir o negócio da família, os mesmos não devem abrir mão de sua profissionalização como gestor, mesmo que tenham sido criados dentro da empresa. “Ser filho do dono não é requisito suficiente para assumir o comando de uma empresa. Mesmo o herdeiro precisa provar que está capacitado para tal tarefa”, enfatiza o consultor. Camorim destaca ainda que a contratação de um especialista para fazer a transição é muito importante , por fatores como a ausência de relacionamento familiar e emocional e a necessidade de se trazer novas técnicas e boas práticas de gestão que nem sempre são utilizadas nas empresas familiares.

A dinâmica de relacionamento entre a família e o negócio é um aspecto crucial para a longevidade da empresa familiar. Marcelo Camorim explica que para garantir alinhamento e comunicação clara entre os membros da família, é recomendável elaborar documentos que disciplinem esse relacionamento.

Porém, conforme o estudo “Governança em Empresas Familiares: Evidências Brasileiras” menos da metade das empresas familiares no País têm algum documento com tal finalidade. “Isso, infelizmente, é um mal típico em muitas empresas familiares, que pelo fato de se achar que tudo está entre família, não é necessário formalizar normas e funções societárias. Aliás, essa formalização é importante não só para a saúde da empresa, mas também para o bem-estar da própria família”, esclarece Camorim.

Fonte: Economia – iG

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